3D Pinball Space Cadet: a história do jogo que marcou toda uma geração no Windows
3D Pinball Space Cadet: a história do jogo que marcou toda uma geração no Windows
O som metálico da bolinha sendo lançada pela rampa. O barulho característico dos bumpers acendendo em sequência. A frustração de ver a esfera escorregar entre os flippers no momento decisivo. Quem passou pela era do Windows 95 ao XP carrega essas memórias sensoriais do 3D Pinball Space Cadet. O que poucos sabem é que essa mesinha espacial esconde uma história de desenvolvimento acelerado, decisões de última hora e até bugs que mudaram seu destino.
De Doom censurado a fliperama espacial
Em 1994, a desenvolvedora texana Cinematronics LLC foi fundada por David Stafford, Mike Sandige e Kevin Gliner com um objetivo ambicioso: criar jogos nativos para o Windows 95, enquanto a indústria ainda focava no MS-DOS. A primeira tentativa foi “Gluem”, um clone de Doom onde o jogador atirava cola ao invés de balas — uma versão adocicada do FPS violento que dominava a época. Quando David Stafford apresentou o protótipo para a Microsoft, David Cole, chefe do projeto Windows 95, rejeitou a ideia e perguntou: “Não podemos ter um jogo de pinball?”
Stafford aceitou o desafio na hora. No dia seguinte, apresentou um esboço de “Pinball Wizard”, que foi aprovado imediatamente. O problema? Era apenas um conceito no papel. A equipe teve poucos dias para desenhar uma mesa preliminar e enviá-la por fax para a Microsoft. Com apenas nove meses para entregar um produto finalizado e lançamento previsto para início de 1995, o desenvolvimento virou uma maratona de 18 a 20 horas diárias. Um adiamento para agosto de 1995 deu fôlego extra ao projeto.
A atenção aos detalhes
Kevin Gliner, responsável pelas regras e design da mesa, visitou fliperamas tradicionais para estudar componentes e entender a evolução das mesas de pinball ao longo da história. Ryan Medeiros, designer visual líder, fotografou máquinas reais no Santa Cruz Beach Boardwalk como referência. A decisão técnica foi criar um jogo 2D com gráficos pré-renderizados em 3D — mais simples que um ambiente totalmente tridimensional, mas visualmente convincente.
Mike Sandige construiu a engine de física quase inteiramente baseada em dados, com um sistema de scripts que permitia ajustes finos nos materiais e comportamentos dos componentes. A atenção aos flippers foi obsessiva: precisavam ser realistas sem sobrecarregar o hardware da época, e a bola jamais poderia atravessar paredes ou objetos. A programação inicial foi feita em Delphi e depois traduzida para C/C++ com trechos em assembly x86. Os assets 3D foram criados no TrueSpace, depois migrados para um programa baseado em MS-DOS, enquanto animações e design final passaram pelo Adobe Photoshop.
Do Microsoft Plus! ao XP
O 3D Pinball Space Cadet estreou no Microsoft Plus! 95, um pacote comercial de complementos para o Windows 95. Posteriormente, foi incluído no Windows NT 4.0, Windows 2000, Windows Me e Windows XP — este último sendo a versão final a trazer o jogo nativamente. A versão limitada da Microsoft suportava apenas resolução 640×480 e exibia uma imagem 2D na lateral, diferente do Full Tilt! original que oferecia três resoluções até 1024×768 e gráficos laterais pré-renderizados em 3D.
Na Microsoft, o engenheiro Dave Plummer converteu trechos em assembly x86 para C/C++, permitindo compatibilidade com as versões Alpha, MIPS e PowerPC do Windows NT 4.0. Raymond Chen implementou um limitador de taxa de quadros para reduzir o uso de CPU — recurso que ele mais tarde descreveu como sua contribuição favorita ao Windows XP. O executivo Jim Allchin queria exibir as novas APIs gráficas e de som do NT, e o Pinball se tornou a vitrine perfeita, mesmo sendo um sistema voltado para negócios.
O bug que derrubou a mesa
A ausência do jogo no Windows Vista gerou anos de especulação. Segundo Raymond Chen, o Pinball foi removido devido a um bug de detecção de colisão durante o desenvolvimento das versões 64-bit do Windows. A Microsoft não conseguiu resolver o problema a tempo do lançamento do Windows XP 64-Bit Edition para arquitetura Itanium em 2001. Chen esclareceu depois que a versão 64-bit do XP foi desenvolvida no hardware Alpha AXP — o Itanium ainda não existia —, e foi nessa plataforma que o bug apareceu.

Curiosamente, o Windows XP Professional x64 Edition de 2005 incluiu uma build 64-bit oficial do Pinball com apenas pequenos problemas gráficos. Versões funcionais em 64-bit também foram encontradas no CD-ROM da atualização de 2003 do Windows XP 64-Bit Edition e em builds iniciais do Windows Vista (então chamado “Longhorn”). Especula-se que o time de runtime C ou de compilador tenha corrigido o bug em algum momento. A teoria mais aceita hoje é que o Pinball foi removido definitivamente por ter visual considerado ultrapassado, assim como outros jogos clássicos do Windows.
Tentativas frustradas de ressurreição
Em 2018, Raymond Chen revelou que houve várias tentativas de reviver o jogo como projeto do Microsoft Garage. A equipe conseguiu reempacotar a versão x86, mas ao revisar o contrato original de licença, o departamento jurídico descobriu que novas versões só poderiam ser lançadas pré-instaladas em sistemas operacionais Windows ou pacotes Microsoft Plus!. O contrato também proibia a liberação do código-fonte.
Em 2021, o desenvolvedor Muzychenko Andrey descompilou e fez engenharia reversa da versão Space Cadet incluída no Windows, portando-a não oficialmente para C++ sobre SDL. Isso permitiu que o jogo rodasse nativamente em Mac OS, Linux, navegadores, Android, webOS da LG, Wii, Wii U, 3DS e PlayStation Vita. O link para download está disponível no Github.
O segredo que a Microsoft escondeu
Poucos jogadores sabem que Space Cadet era apenas uma mesa de demonstração do Full Tilt! Pinball (1995), desenvolvido pela Cinematronics e publicado pela Maxis — a mesma empresa por trás de The Sims.

O jogo completo trazia outras duas mesas: Skulduggery, com tema pirata e caça ao tesouro, e Dragon’s Keep, ambientada em fantasia medieval com missões de resgate e combate ao dragão. Seis meses após o início do desenvolvimento do Space Cadet, a Cinematronics fechou acordo com a Maxis para criar o Full Tilt! com as mesas adicionais.
A Microsoft aparentemente tentou esconder a existência do jogo completo. No Space Cadet do Windows, os nomes Cinematronics e Maxis aparecem em vermelho escuro borrado contra fundo preto, enquanto no Full Tilt! aparecem em amarelo brilhante e alta definição. A versão Windows exibia apenas uma janela de texto com detalhes do jogo, sem nenhuma menção ao Full Tilt!. Mesmo assim, a Maxis lançou Full Tilt! Pinball 2 em outubro de 1996, com três novas mesas: Mad Scientist, Alien Daze e Captain Hero.
Legado indestrutível
Em março de 2020, os efeitos sonoros do Space Cadet foram sampleados na música “You Better Move” de Lil Uzi Vert, gerando reações nostálgicas de fãs que cresceram jogando. O som da bola ricochetando, dos bumpers e do lançador continua sendo uma memória sensorial instantânea para milhões de pessoas — talvez mais marcante que o próprio Windows 95.
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