
CEOs sabem que a IA vai cortar empregos — só não querem falar sobre isso
CEOs sabem que a IA vai cortar empregos — só não querem falar sobre isso
Enquanto os CEOs de grandes empresas tecnológicas discursam sobre inovação, produtividade e crescimento, uma verdade menos palatável é cuidadosamente omitida das falas oficiais: a inteligência artificial já está redesenhando o mercado de trabalho. E boa parte desse redesenho envolve cortes silenciosos.
Em eventos, entrevistas e posts corporativos, prevalece o tom otimista: “Estamos contratando”, “A IA vai aumentar a eficiência”, “Vamos liberar o potencial criativo dos times”. Mas nos bastidores, a conversa é outra. Segundo investidores do setor de software, como Jason Lemkin e Rory O’Driscoll, muitos executivos já têm plena consciência de que não precisarão manter o tamanho atual de suas equipes nos próximos anos. O problema? Assumir isso em público seria devastador para a imagem da empresa — e para a moral interna.
O que dizem os bastidores: menos vagas, mais silêncio
Durante uma edição recente do podcast Twenty Minute VC, Lemkin foi direto: “Todo mundo sabe que não precisa de 30% a 40% do time atual. Eles simplesmente não podem dizer isso.” A pressão pública é tão intensa que a resposta mais segura é repetir o discurso da continuidade: “Na verdade, estamos contratando”.
A tática virou padrão: blindar a reputação da empresa e evitar crises internas com mensagens genéricas. Para O’Driscoll, da Scale Venture Partners, esse teatro corporativo resulta em “declarações inofensivas”, embaladas em jargões como “ninguém será demitido, só vamos mudar o foco”. Mas ele é direto: “Esse é o estado atual da mentira.”
Klarna, Duolingo e o dilema da transparência
Alguns casos recentes ilustram o malabarismo que as empresas estão fazendo. Sebastian Siemiatkowski, CEO da Klarna, chegou a declarar que a IA já consegue realizar todas as funções humanas, e admitiu que a fintech sueca não contratava há mais de um ano. Mas a reação negativa foi tão intensa que, semanas depois, o executivo recuou publicamente.
O mesmo ocorreu com Luis von Ahn, do Duolingo. Após anunciar um plano para transformar a empresa em “AI-first”, ele enfrentou uma onda de críticas e precisou reformular a narrativa, negando que a IA substituiria funções humanas. Segundo ele, a empresa segue contratando no mesmo ritmo.
A previsão (nada otimista) para os próximos dois anos
Lemkin acredita que os cortes mais significativos acontecerão até 2027. Ele não fala de uma demissão em massa repentina, mas de um esvaziamento gradual: as vagas que antes seriam abertas simplesmente deixarão de existir. “O número total de funcionários vai se manter estável”, prevê, “mas os papéis vão mudar — e muito”.
O’Driscoll complementa com uma estimativa: quedas de 2% a 3% nas contratações ano após ano. E esse cenário não vale apenas para startups. Grandes empresas de tecnologia também já estão ajustando suas metas silenciosamente.
A rara exceção: quando um CEO joga a real
Entre tantos discursos ensaiados, uma voz destoou. Dario Amodei, CEO da Anthropic, foi direto ao ponto: a IA pode eliminar até 50% dos empregos de nível básico em escritórios. Ele ainda criticou abertamente a conivência entre empresas e governos ao minimizar os impactos dessa transição no setor de tecnologia, finanças, direito e consultoria.
Sua fala expõe o dilema ético: até que ponto as empresas devem ser transparentes sobre as transformações estruturais que estão provocando? A retórica positiva pode aliviar tensões no curto prazo, mas também impede que trabalhadores, sindicatos e instituições se preparem para uma reconfiguração profunda do mercado de trabalho.
Transparência seletiva: uma estratégia arriscada
O silêncio das lideranças não apaga os números. E com o avanço da IA em áreas como atendimento, análise de dados e produção de conteúdo, a tendência é que o impacto nos empregos se torne cada vez mais visível, independentemente do que dizem os comunicados oficiais.
Esse abismo entre o discurso corporativo e o impacto real da IA no trabalho também é percebido fora das salas de reunião. A Pesquisa Game Brasil 2024 revelou que, no Brasil, a maioria dos trabalhadores vê a inteligência artificial como uma aliada produtiva — mas teme seriamente ser substituída por ela. A sensação de insegurança convive com o entusiasmo pelas novas ferramentas, criando um paradoxo: as pessoas reconhecem os ganhos de eficiência, mas sentem que não estão sendo preparadas ou protegidas para o que vem a seguir.
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